O fim das revistas de papel é o fim de nosso tempo livre - e agora?
Quando foi a última vez em que você comprou uma revista? Há poucas semanas, o grande público foi surpreendido pelo fim de várias delas: a editora Abril, mal das pernas há alguns anos, encerrou títulos tradicionais que nos acompanhavam há gerações. Para mim, não é exatamente uma surpresa. Trabalhei lá por quase dez anos e, por quase toda a minha carreira, no que hoje chamamos de jornalismo impresso, mas que há alguns anos era só jornalismo. Vi de perto a crise no setor, a debandada dos anúncios publicitários, as demissões de dezenas de colegas. E tudo isso foi bem triste mesmo.
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Por outro lado, é mais triste ainda uma empresa de comunicação do porte da Editora Abril não ter acompanhado a revolução da comunicação. Ter priorizado o papel quando todo mundo passava o dia em frente a um computador, ávido por mais informação. Ter ignorado o surgimento das redes sociais como um concorrente poderoso – e não apenas como uma ferramenta de divulgação do que estaria na banca durante aquele mês. Ter achado que ter internet no bolso, ao alcance de um dedo, não iria interferir no consumo de revistas consagradas. E ter encerrado tudo isso agora devendo para funcionários que tentaram reverter esse quadro e não encontraram apoio da chefia.
Mas tem ainda mais um lado que é o nosso como leitor. Faz um tempo que não compro uma revista. Li algumas recentemente, por conta de minha profissão, mas não me dirigi até a banca para comprá-las. Trabalhei em revistas por 10 anos, sei de seu potencial de informação, mas sei também do baile que elas tomam da internet em rapidez e praticidade.
O celular é um concorrente forte do nosso tempo livre. E eu diria que ele venceu. Se antes eu sentava no consultório médico ansiosa para folhear umas páginas, hoje aproveito para responder o whatsapp (enquanto escrevo, são mais de 100 mensagens não lidas), o e-mail, ir de lá para cá no Instagram Stories e, no fim, não ver nada direito. Revistas bem-feitas concorrem inclusive com o Candy Crush, que ninguém assume que joga, mas joga. Não dá tempo de fazer todas essas atividades que não existiam antes do Smart Phone e ainda ler uma reportagem aprofundada. Uma pena.
Não é questão de ser saudosista (coisa que sou, sim). Ou de rejeitar os novos tempos (que já estão aí há 20 anos, só não vê quem não quer). Para mim, é uma questão de repensar nosso modo de vida. Eu amo a internet. Eu trabalho com internet. Eu me comunico pela internet. Eu posso dizer que durmo na internet, já que, se por acaso acordo no meio da noite, checo o horário no celular entre notificações, não raro me distraio ali e termino por perder o sono. Mas será que meu cérebro não precisa de uma pausa, daquelas que a revista no consultório médico dava?
Fico triste pelo fim das revistas, que nos acompanharam por tanto tempo. Fico triste por uma empresa do porte da Abril não ter tido humildade suficiente para se reiventar, mesmo sentindo a urgência disso nos últimos anos. Mas fico triste mesmo por não termos mais tempo de pensar no que estamos fazendo com nosso tempo.
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