Topo

Luciana Bugni

A quarentena já acabou para você também?

Luciana Bugni

14/06/2020 12h20

Como eu gostaria de estar com os amigos que eu gosto – mas sou brasileira e estou em casa (Pexels)

Carla está em uma festa mexicana com as amigas em Vancouver. Tem uma mesa decorada com caveiras e potinhos repletos de guacamole e outras delícias. Umas cinco garotas sorriem para a foto. Eu suspiro: que saudade das minhas amigas.

Elena e Nina estão em diferentes parques em Berlim. As crianças de Elena parecem se divertir no playground. Nina visita o mercado de pulgas usando uma máscara. Faz um sol de fim de primavera. Eu suspiro: que saudade de passear ao ar livre.

Yohana está em uma piscina na Califórnia com a irmã e a sobrinha. Afe, que saudade da minha família.

Veja também

90 dias em casa: antes isolado do que mal acompanhado no Dia dos Namorados? 

Caiu outro avião e a gente não aprendeu a aproveitar o momento e os amigos 

Chilique e ameaças ao ser atacado: Bolsonaro nos ensina como não agir

Eric enfia os dois pés num lago nórdico. Natália visita bares lisboetas repletos de mesas nas calçadas. Thalula passeia empurrando o carrinho de bebê na Espanha. Gus reclama no movimento excessivo em Madri. Aline mostra um amigo tocando violão à beira de um rio norueguês.

Num rápido passeio pelo mundo via Instagram, não posso sentir outra coisa que não suspiros invejosos. Confinada há 90 e tantos dias, quebrei o recorde até dos ganhadores do BBB, que não passam de três meses dentro de casa (e a minha não tem nem piscina, nem academia, muito menos a promessa de uma fortuna lá fora se eu ficar até o final). Aparentemente meu grande prêmio é ficar viva. Meu Instagram não mostra mais que umas banderinhas de festa junina penduradas na sala em uma tentativa de festa para os três moradores. O de três anos se divertiu. Eu comi paçoca.

Aqui no Brasil, o bicho também está pegando. Bares clandestinos, festinhas na casa de gente, corridas em grupo, churrascos com distância social e máscara (?). Meu vizinho recebe visitas todo sábado. No hall, escuto as vozes diferentes comentarem enfermidades e mortes de conhecidos com a maior naturalidade. Aí todos entram e curtem uma live sertaneja. Os noticiários nos contam que os óbitos estão aumentando todos os dias. O presidente pede que seus seguidores entrem nos hospitais para provar não consigo entender muito bem o quê. Eles obedecem com tacos de madeira nas mãos. Desligo a TV incrédula.

Um amigo diz que estou ficando chata. Que não posso julgar quem está saindo de casa: não sabemos, afinal, como está a saúde mental dos outros confinados. Eu reflito. Não condeno o caos no Brás, pessoas tentando comprar roupas para vender em suas lojas. Mas será mesmo que a gente precisa fazer uma festinha com oito amigos com o mundo caindo lá fora? A resposta óbvia é não. Ligo o Zoom outra vez e as caras e vozes conhecidas e queridas na tela quase me bastam.

Gosto de ficar em casa? Nunca tinha experimentado por mais de 48 horas seguidas antes do último março. Diria que não é muito da minha personalidade. Mil vezes mercados de pulgas, bares nas calçadas e amigos tocando violão no gramado. Mas gosto mais de sobreviver e garantir que quem tem essa vontade também faça o mesmo. Pra daqui um tempo, quando realmente a curva cair, eu possa fazer como os amigos fora do Brasil que eu invejo via Instagram. Entender o novo normal, tomar os cuidados necessários e botar o pé na grama e a cara (de máscara) no Sol.

Eu sou, como no meme, uma das 18 pessoas ainda em isolamento no Brasil. Tenho o privilégio de trabalhar de casa e poder continuar assim. Mas, justamente por isso, parece que virei uma chata que não aceita nem faz mais convites. A quarentena também acabou para você?

Você pode discordar de mim lá no Instagram.

 

Sobre a autora

Luciana Bugni é gerente de conteúdo digital dos canais de lifestyle da Discovery. Jornalista, já trabalhou na “Revista AnaMaria”, no “Diário do Grande ABC”, no “Agora São Paulo”, na “Contigo!” e em "Universa", aqui no Uol. Mora também no Instagram: @lubugni

Sobre o Blog

Um olhar esperançoso para atravessar a era digital com um pouco menos de drama. Sororidade e respeito ao próximo caem bem pra todo mundo.