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Luciana Bugni

Decidir deletar o Facebook parece difícil como parar de fumar

Luciana Bugni

17/04/2018 05h00

Olha pra frente, moça (Foto: iStock)

 

Você já parou de fumar? Largou qualquer coisa de que gostava muito? Terminou um relacionamento daqueles em que parecia viciado no outro? Pois pode parecer exagero, mas deletar a conta no Facebook tem muito disso. A história já estava anunciada: esse bagulho não faz bem para nossa saúde, não. Motivos não faltavam para abandonar a rede social. Mas nas semanas recentes, a coisa mudou de figura. Mark Zuckerberg, o criador da coisa toda, tirou os habituais jeans e camiseta preta e, de terno, foi depor na Corte americana (e ensinar um pouco de internet aos progressistas). A cena era até engraçada, mas por trás daquele circo há uma coisa muito séria. Mais do que anúncios de camisolas de amamentação, carros novos ou passagens aéreas no Facebook, você pode estar recebendo um novo jeito de pensar. E talvez você nem queira pensar assim.

Na prática, a gente não reflete muito sobre isso. Poxa, eu sou inteligente, leio notícias das mais variadas fontes. Tento ouvir quem pensa diferente de mim. Não vou cair nessa armadilha, né? Pois não é bem assim. De tanto curtir uma coisa e outra na rede social, ela começou a me mostrar só pontos de vista com os quais eu concordava. Aí ficou difícil ver o outro tipo de pensamento. E ainda mais complicado evitar a tentação de achar qualquer pessoa que pensasse de outra forma um idiota — quando pode ser que a idiota esteja sendo eu, já que o algoritmo me dá respaldo e curtidas para ser assim e ainda me achar o máximo. Complexo isso aí, hein?

Então tá, a solução para o problema é óbvia. A gente precisa sair do Facebook. Mas o que não falta é desculpa para ficar. Seja para monitorar o uso que os filhos fazem, seja para manter contato com aquelas pessoas que nunca mais veremos, seja para alavancar nossas peripécias profissionais, alimentar nosso ego com joinhas ou para matar o tempo com vídeo de gatinho mesmo…  como a gente sai da rede social? No fundo, essas desculpas são só preguiça de mudar um padrão de comportamento. Conseguiríamos voltar a viver como há dez anos? Pelo desdobramento das últimas notícias, vazamento de dados e emburrecimento geral das nações (você reparou que leu muito menos livros nos últimos anos?), parece que é o mais inteligente a se fazer.

Se a crise de abstinência te pega de jeito só de pensar no assunto, tente pelo menos apagar o aplicativo do celular. Você pode, sim, usar o FB, mas desde que esteja em um computador. O uso fica limitado e você percebe que está ganhando tempo. Eu fiz isso há um ano e pouco e, depois de um começo esquisito, nunca mais senti falta. Mas não vale substituir pelo Instagram e passar dias e noites em qualquer hora vaga deslizando o dedo para lá e para cá nos Stories (faço isso, confesso, troquei o cigarro por outro cigarro mais colorido). O Instagram, aliás, é da mesma empresa que o Face e WhatsApp. Se sua ideia for não dar mais seus dados para o Sr. Zuckerberg fazer o que quiser com eles, precisa excluir esses três aplicativos. Viu só como amarraram bem a gente?

Mas, se não se importar em estar constantemente vigiado por essa turma, deletar o app do celular já é interessante pra ganhar mais tempo, voltar a olhar para atravessar a rua, não descer no ponto errado do ônibus porque estava distraído… enfim, estar presente onde você realmente está. E não ficar de olho no fim de semana que seu colega de trabalho teve na chácara da sogra, por exemplo. Ou nas convicções políticas de seu vizinho que odeia todos. Ou na maluquice que é a paixão por futebol de seu tio. Lugares em que, vamos pensar por nós mesmos,  nem gostaríamos de estar. Seus neurônios agradecem.

Sobre a autora

Luciana Bugni é gerente de conteúdo digital dos canais de lifestyle da Discovery. Jornalista, já trabalhou na “Revista AnaMaria”, no “Diário do Grande ABC”, no “Agora São Paulo”, na “Contigo!” e em "Universa", aqui no Uol. Mora também no Instagram: @lubugni

Sobre o Blog

Um olhar esperançoso para atravessar a era digital com um pouco menos de drama. Sororidade e respeito ao próximo caem bem pra todo mundo.