Topo

Luciana Bugni

Ghosting ou falta de educação mesmo?

Luciana Bugni

05/09/2017 08h00

Cadê, né? (Foto: Reprodução)

Você já ouviu falar de ghosting? Mesmo que não tenha ouvido a palavra, pode estar praticando por aí. Quem me disse essa expressão pela primeira vez foi uma amiga. Estava saindo com um cara bonitinho do Happn, chef de cozinha, fez dois cafés da manhã incríveis com croque-monsieur. Ela cogitando convidá-lo para viajar pra Paraty com uns amigos dela e tcharan: ghosting. O cara desapareceu. Nunca mais nem sinal, nem os palitinhos ficaram azuis, nem ele ficou online outra vez, nem atendeu o telefone. Deve ter morrido, ela pensou. Nada. Meses depois, viu de relance saindo de um cinema com uma moça. Ela se escondeu na livraria.

Depois, aconteceu com um amigo. Dormiu na casa da menina por dois meses, levou para conhecer os amigos, quase apresentou para a mãe. Fizeram planos com antecedência, viram duas séries inteiras na HBOgo juntos, pensaram em começar a ir à academia. De repente: plim. Ela sumiu. E-mail nos itens enviados e nunca mais resposta na caixa de entrada. "Mas o que eu fiz?", ele perguntava para si mesmo. "Cogitar ir na academia junto foi longe demais", concluiu. Convenhamos, hoje em dia não há relacionamentos tão longevos quanto um plano semestral da SmartFit.

A outra me mandou mensagem: "Tudo maravilhosamente bem e o cara sumiu. Tive que perguntar, para ter certeza de que ele não havia sido sequestrado ou estava internado em estado terminal". Dessa vez, passado um tempo, o cara respondeu: "Perdi o embalo do romance".  A resposta, de tão ampla, continua deixando dúvida. Que raios quer dizer isso? Mas é mais que nada. O cara superou o ghosting com uma frase vazia e, de uma forma prática, ela entendeu que devia tocar a vida. É o ideal? Não. Mas melhor que silêncio eterno que gera a dúvida das infinitas possibilidades.

Entender que a fila anda não é das mais agradáveis atividades. Terminar um caso também não é a coisa mais gostosa que a gente tem para fazer. "E aí, planos pro finde?" "Tô animadão, vou dar um pé na bunda da Ju e depois ver algo na Netflix". Mas por menos animador que seja, a pessoa com quem você dividiu as últimas camisinhas merece mais do que dois palitinhos cinza no WhatsApp para toda a eternidade. Questão de educação: qualquer "o problema não é você, sou eu", coloca um ponto final na história e a outra parte se sente na obrigação de ligar pra uns amigos, se arrumar e sair pra cantar "I Will Survive" na noite.

Ghosting é o novo "mãe, fala pra ele que eu não tô". Mas não dá nem a chance de perguntar "tá bom, dona Lourdes, você sabe se ela demora?" Na quarta ligação, sua mãe já teria te pegado pela orelha e obrigado a terminar isso de forma digna. Enquanto isso, você está lá, seguro, contato bloqueado no WhatsApp, sem nem saber se a pessoa está viva depois do baque. E o outro lá, do outro lado, pensando o que podia ter feito diferente. Porque pode parecer difícil em tempos líquidos se colocar no lugar do outro, mas dizem por aí que as pessoas também têm sentimentos, sabia?

Depois de tantas histórias, fiquei aqui elencando motivos para o ghosting e não saí muito de um principal, que na verdade é até pecado capital: preguiça. Preguiça de explicar os motivos. Preguiça de ouvir a contrapartida. Preguiça de assumir pra si mesmo que não deu certo (de novo). E também preguiça de perder tempo se justificando com alguém, pedir a conta e sair fora, quando você podia estar aproveitando os novos matches que a vida traz.

Minha amiga disse que é adepta. "Basicamente, dei uma ignorada no cara. Estava de bode", ela disse e, antes que eu contestasse: "sim, fui babaca, mas às vezes isso acontece".  Ela disse que é no Tinder que mora a solução para a solidão. Um catálogo infinito de possibilidades e a gente não pode perder tempo respondendo uma história que já foi. Tá.

Mas, vem cá: quando foi que a boa educação e a empatia deixaram de ser modernos?

¯\_(ツ)_/¯

Sobre a autora

Luciana Bugni é gerente de conteúdo digital dos canais de lifestyle da Discovery. Jornalista, já trabalhou na “Revista AnaMaria”, no “Diário do Grande ABC”, no “Agora São Paulo”, na “Contigo!” e em "Universa", aqui no Uol. Mora também no Instagram: @lubugni

Sobre o Blog

Um olhar esperançoso para atravessar a era digital com um pouco menos de drama. Sororidade e respeito ao próximo caem bem pra todo mundo.