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Luciana Bugni

"Gado": sem curtida no Instagram, tem gente que não sabe do que deve gostar

Universa

31/07/2019 04h00

A personalidade dos jovens se baseiam no que os outros curtem? (iStock)

O adolescente chega meio ressabiado, celular nas mãos, aquele olhar de insatisfação. "Que saco que não tem mais curtida no Instagram". Eu me apressei em dizer que dava para ele ver as próprias curtidas, bastava clicar no nome da pessoa etc. E que não precisava sofrer tanto assim. Ele sabia, claro. Que ousadia tentar explicar para alguém de 18 anos alguma novidade da rede social…

O que estava incomodando o garoto era não poder ver as curtidas dos outros e assim saber o que é legal. É isso mesmo. Sem saber o que todo mundo gosta, ele estava achando muito difícil navegar na rede pois teria que decidir sozinho o que curtir. E ele nunca decidiu isso sozinho, oras. Desde que está no Insta, há uns cinco anos, o que as pessoas curtem determina o que é bom ou não é. Melhor exemplo do que é ser "influenciado".

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A gente usa tanto o termo "influencer" que nem percebe o quanto ele é perigoso. Isso atrapalha a formação de personalidade de quem está ali todo dia crescendo com os olhos grudados num feed muito rápido. O menino de 18 anos estava muito descontente porque a atitude simples de terminar com a exposição do número de curtidas das fotos afetava diretamente as decisões dele. Lógico que a questão não termina no jovem. Tem muito marmanjo que só curte o que todo mundo curtiu. Como se a opinião da massa desse o aval para gostar ou não de algo.

Fiquei pensando quando eu aprendi o que eu gostava. Certamente influenciada por algum amigo, pela MTV e pelo rádio, pelas revistas que eu lia, pelos meus artistas favoritos. Nessa época, gostar só porque todo mundo curtia não tinha cabimento — eu até fazia o contrário e garimpava bandas e filmes que ninguém sabia que existiam para serem meus favoritos. Chatice, claro.

Mas isso de se basear na aprovação alheia para então aprovar também, lembra o movimento do gado, que só vai para onde todo mundo está indo, sem pensar no assunto. A palavra, aliás, está na moda hoje em dia para representar o lado da polarização política do país. Todo mundo curtiu? Então certamente é bom, pensa o usuário de rede social que se porta como gado.

O problema da postura de gado é que os bichos geralmente são encaminhados pro abatedouro. Eles morrem sem nem entender direito o que aconteceu.

Melhor aproveitar o fim da curtida para pensar bem no que você gosta de verdade. No que faz bem, no que agrada e melhora o mundo. Foi o que eu disse para o garoto de 18 anos. Se ele vai ser influenciado por isso ou não, não sei. 🙂

Sobre a autora

Luciana Bugni é gerente de conteúdo digital dos canais de lifestyle da Discovery. Jornalista, já trabalhou na “Revista AnaMaria”, no “Diário do Grande ABC”, no “Agora São Paulo”, na “Contigo!” e em "Universa", aqui no Uol. Mora também no Instagram: @lubugni

Sobre o Blog

Um olhar esperançoso para atravessar a era digital com um pouco menos de drama. Sororidade e respeito ao próximo caem bem pra todo mundo.