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Luciana Bugni

Novela das 21h comprova: o brasileiro gosta mesmo é de passar raiva

Universa

13/09/2018 04h00

Precisa ser tão tonta, Luzia? (Reprodução/Tv Globo)

Se tem coisa difícil nessa vida é torcer para heroína burra em novela. Acontece que tem rolado com certa frequência: só de pensar um pouco, eu lembro de umas cinco mocinhas tapadas no horário das 21h, nos últimos anos. Não por acaso, lembramos mais dos vilões, como Félix de Mateus Solano, em Amor à Vida (2013) – bem mais legal que a irmã sonsa, Paloma, de Paolla Oliveira. E Nina (Débora Falabella) atormentava tanto o juízo dos telespectadores que as pessoas preferiam torcer para Carminha (Adriana Esteves), uma diaba sem coração.

Pois aqui estamos nós de novo: passando raiva com Luzia (Giovanna Antonelli) em Segundo Sol. A gênia, de novo, fugiu da cena de um crime que não cometeu. O público pensou o quê? "Eles estão me tirando de idiota". E parou de ver a novela? Não, continuou vendo para ver o que ia acontecer com essa tonta. O que me faz concluir o óbvio: a gente gosta mesmo é de passar raiva.

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A prática é comum: um amigo passa o dia lendo comentários em matérias de internet que são contrários ao que ele acredita. Quanto mais absurdo for o comentário, quanto mais contrariar os seus ideais, mais nervoso ele fica. E faz o quê? Medita? Não, lê mais.

As bicicletas da discórdia

Eu vi vários posts na internet falando das bicicletas Yellow, que podem ser alugadas por alguns minutos e deixadas em qualquer lugar. Os posts não elogiavam a iniciativa e, sim, diziam que o brasileiro não era capaz de usufruir de um projeto legal. As fotos dos posts eram de bicicletas arrebentadas, pneus roubados, rodas quebradas e etc. Uma lástima. Eu fiquei doida de raiva – nem sabia que dava para pegar essa bicicletas na rua e o brasileiro já tinha acabado com tudo.

Pois então. No dia seguinte, vi uma bicicleta dessas amarelinhas na rua. Intacta, perfeita, esperando o próximo usuário. Tem mais de um mês que ando por São Paulo – e eu ando muito – e vejo todo dia uma dessas inteirinha esperando que um brasileiro queira utilizá-la. Vejo também várias em movimento. Quebrada mesmo, não vi nenhuma. Só na internet. E porque a gente não compartilha que o projeto dá certo, que tem gente pedalando de boas e deixando a bike para o próximo, como se fosse na Europa? Porque a gente gosta de passar raiva. O post das bicicletas arrebentadas deixa a gente puto com nossos compatriotas. É muito mais legal do que falar bem do Brasil, né?

Aliás, nos meus passeios pela Europa eu já flagrei muita bicicleta com roda roubada. Só nos canais de Amsterdã, são jogadas milhares de bikes todos os anos. Mas não tem graça falar mal disso, né? Que graça tem passar raiva com europeu?

Meu pai falava que no sítio, tinha um bezerro que às vezes comia pimentas do pimenteiro. Quanto mais ardia, mais ele berrava e comia mais para ver se passava. Eu achava engraçado o bezerro berrando. E não é que a gente na frente da televisão e do computador é igualzinho o bezerro de meu pai?

Nota da autora: troquei bezerro por cabrito e os leitores prontamente me avisaram. Erro corrigido. Obrigada! 

Sobre a autora

Luciana Bugni é gerente de conteúdo digital dos canais de lifestyle da Discovery. Jornalista, já trabalhou na “Revista AnaMaria”, no “Diário do Grande ABC”, no “Agora São Paulo”, na “Contigo!” e em "Universa", aqui no Uol. Mora também no Instagram: @lubugni

Sobre o Blog

Um olhar esperançoso para atravessar a era digital com um pouco menos de drama. Sororidade e respeito ao próximo caem bem pra todo mundo.