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Luciana Bugni

Bater nos filhos para educar, como o casal de Itapetininga: até quando?

Luciana Bugni

05/03/2018 16h42

Exercitar a paciência e chamar para o diálogo é a chave (Foto: iStock)

 

Eu apanhei na infância. Nunca fui espancada, não tenho memórias de cintadas e nunca tive marcas das surras que eu levei, mas cresci nos anos 80, quando imperava o "tapinha não dói". É difícil encontrar alguém que cresceu nessa época e foi educado sem ter tomado uns tapas uma vez ou outra. Lembro claramente da sensação de pânico de ter feito algo errado e saber que iria apanhar. De tentar mentir para remediar. A possibilidade do tapa não me impedia de errar. Hoje, mais de 30 anos depois, não vejo como os tapas ajudaram na minha educação. Pelo contrário, lembro de conversas tranquilas em que minha mãe passava os valores de honestidade e respeito pelo próximo que eu carrego até hoje. O que me faz crer que educar não é na porrada. Nem no tapinha. Educar é na conversa. É isso que a gente leva para a vida adulta.

Muito caminhamos nos últimos 40 anos e sabemos hoje que bater mais prejudica do que torna as crianças disciplinadas. Há uns 15 anos, quando os especialistas começaram a questionar os efeitos educativos da palmada, dar uns tabefes em uma criança em público vale olhares de reprovação dos desconhecidos. Não é para menos: o tapinha que não dói faz com que os menores aprendam que é batendo que se resolve os problemas — afinal, "meus pais fazem assim." Crianças entendem que bater é mais definitivo que uma conversa, porque a briga acaba ali no momento da agressão, quando pais e filhos vão cada um para o seu quarto (e para seus próprios "fique ali quietinho pensando no que você fez").

Sim, funciona. No momento que apanha, a criança para de fazer o que estava fazendo — a situação é tão extrema que ela não entende o que houve e interrompe pelo susto. Mas, como não entendeu direito o que houve, repete a atitude — e apanha de novo. O resultado é medo, desenvolver a capacidade de mentir ou esconder coisas que não sabe se serão aprovadas ou não… uma confusão danada que seria resolvida com diálogo.

Tudo isso para chegar no extremo do casal de Itapetininga (SP) que é suspeito de ter espancado a filha de 5 anos até a morte. A avó, certo dia, chegou à casa enquanto o pai batia na menina no chuveiro, com o cinto, e tentou interromper. Mas a mãe defendeu que ela precisava ser educada.

Meus pais não tinham a informação de que os (poucos) tapas que levei podiam prejudicar mais que ajudar a transformar crianças em adultos íntegros. Mas nós sabemos disso. O argumento "apanhei e não morri" não funciona mais, porque tem criança que morre, sim. E precisamos combater essa velha percepção de que um tapinha ajuda a educar para evitar tragédias como a da menina em Itapetininga, que nos deixa sem fala. Conversar ainda é a melhor forma de educar. Que tenhamos a paciência e a insistência no diálogo para educar nossos filhos da melhor forma possível.

Sobre a autora

Luciana Bugni é gerente de conteúdo digital dos canais de lifestyle da Discovery. Jornalista, já trabalhou na “Revista AnaMaria”, no “Diário do Grande ABC”, no “Agora São Paulo”, na “Contigo!” e em "Universa", aqui no Uol. Mora também no Instagram: @lubugni

Sobre o Blog

Um olhar esperançoso para atravessar a era digital com um pouco menos de drama. Sororidade e respeito ao próximo caem bem pra todo mundo.